terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Terça-feira, pós feriado. Sempre da mesma forma encarava o abrir daquela cortina de aço. O estrondo, a lembrança irritada de colocar graxa... poderia começar com menos barulho, menos estardalhaço. Até hoje entra em crise, suas maiores vendas são os Best Sellers de qualqur gente pra qualquer pessoa. Jamais havia pegado um deles. Sua relação com estes livros era simples e pontual: ganhar dinheiro. Largou sua bolsa na mesa, caminhou até o banheiro da loja e passou a preparar o chimarrão. Era dia de conversa, de receptar as histórias dos amigos, clientes... sabia e já havia confessado, não suportava a maioria. Mas gostava daquela posição: recptadora e transmissora de histórias. Talvez por aproximar-se dos sessenta, tanta coisa experenciada... papel de velha, de anciã já não a incomodava, só não tinha mais paciência. Dos jovens a rebeldia, pretensões de poetas, de fazer poesia; dos velhos a acomodação, os bichinhos, a televisão. Ainda lembra da última menina que apareceu e após uma pergunta gentil, cotidiana, daquelas que se faz para ser simpático com o cliente, ouviu: sou poetisa, escrevo coisas, quer olhar?! Não suportava mais crianças com suas anedotas de adolescentes... como se sua dor fosse única, não fosse do mundo. E o que falar dos velhos! Em sua maioria, chegavam, sentavam, com ou sem jornal em mãos comentavam notícias, julgavam parentes , reclamavam da vida e finalizavam sempre da mesma maneira: "O mundo mudou!"... e claro, sempre na pior... arrogância dos mais velhos... saudosismo barato! Muitas vezes havia pensado em fechar a loja, mas não conseguia, não imaginava viver apenas sob as sombras do seu apartamento. Também já pensara em sair, viajar, mas não se permitia. Havia perdido todos a sua volta, havia feito a opção pela loja. Assim passava os dias: ganhando dinheiro, receptando e repassando histórias. Não as dela, destas quase ninguém sabia, só a dos outros, algumas interessantes, outras pelo menos serviam para um sorriso, para se sentir mais viva, menos morta. Terça-feira pós feriado, logo fim do dia, suspiro, apaga a luz, fecha a porta.

- Contribuição: Belizário -

CRISTINA

Desejosa de algo mais, sentou-se na varanda olhando o vasto campo que cercava a pequena casa. Conhecia aquele sentimento. Sabia onde lhe levaria aquele sentido. Um aperto ansioso por partir dali... Quando ele chegou em casa para o almoço trazendo o cigarro que ela lhe havia pedido, não conseguiu se segurar e lhe disse que tinha que partir...
Mas para onde? Por quê? Como assim?! Assim só... só assim... preciso ir... Você está me deixando? Jamais!! Está bem... entendo o seu amor, entendo que precisa ir... mas eu estarei aqui esperando você pra aquecer quando voltar... Você sabe que me amor é só seu, não sabe? Já lhe provei... Não peço provas! peço apenas que não se esqueça do caminho...Nunca esqueço o caminho...
Se amaram. Tanto tanto que ele não conseguiu voltar para o trabalho. E ela não sabia mais o caminho da porta.